CORAÇÃO NÃO É GAVETA
Engole o choro. Engole sapo. Cala a
boca. Cala o peito.
Mas o corpo fala, e como fala. Fala
a ponta dos dedos batendo na mesa. Falam os pés inquietos na cama. Fala a dor
de cabeça. Fala a gastrite, o refluxo, a ansiedade. Fala o nó na garganta
atravessado. Fala a angústia, fala a ruga na testa. Fala a insônia, o sono
demasiado.
Você se cala, mas o falatório
interno começa.
As pessoas adoecem porque cultivam
e guardam as coisas não digeridas dentro de seus corações. O normal do ser
humano seria a comunicação e conseguir dizer o que está sentindo. Mas nem todos
se habilitam para esse difícil exercício.
Nem sempre digerimos bem aquelas
pequenas coisas, como mensagens mal respondidas, as palavras que
machucam...Você finge que não ouviu, engole e tudo isso vai se acumulando até
que um dia enche.
Esses pequenos fatos indigestos percorrem a
garganta, entram no estômago, invadem o peito, e se deixarmos, calará nossa
boca e nossa paz.
O importante é não deixar acumular
ou achar que simplesmente vai aliviar com o passar dos dias. O tempo até tem um
papel importante, mas não resolve tudo. Tentar mostrar que tudo sempre está bem
requer muita energia, o desgaste emocional é grande.
CORAÇÃO NÃO É GAVETA. Não dá pra
engolir tudo e dizer amém!
Eu sei. Também não dá pra sair por
ai vomitando as coisas entaladas na garganta. Mas dá pra se expressar.
Tem hora que o sentimento pede pra
ser dito, entendido, descodificado, traduzido. Tudo que ele quer é ser
exorcizado pela palavra ou pela via que lhe cabe melhor. Expressar tranquiliza
a dor.
Dor não é pra sentir pra sempre. Dor é
virgula.
Então faz uma carta, um poema, um
livro. Canta uma música. Pega as sapatilhas, sapateia. Faz uma aquarela. Faz
uma vida. Faz uma piada, faz texto, faz quadro, faz encontro com amigos. Faz
corrida no parque. Fala pro seu analista. Fala pra Deus. Fala para o universo.
Se pinta de artista. Conversa
sozinho, papeia com seu cachorro, solta um grito para o céu, mas não se cale.
Pois "se você engolir tudo o que sente,
no final você se afoga."
Text : Ruth Borges
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